DESCULPA, SÉRGIO

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FOTO: BRUNO CANTINI/ATLÉTICO

Ao ser eleito presidente do Atlético, Sérgio Sette Câmara apresentou a nova diretoria, em dezembro de 2017, e disse que apenas Alexandre Gallo falaria sobre futebol. Vinte e seis meses depois, sem diretor de futebol, gerente e treinador, Sérgio foi aos microfones para comentar sobre eliminações precoces, demissões, erros e quais são os planos para que o restante da temporada 2020 não deixe o roteiro de filme de terror ainda mais horripilante para o torcedor.

Folhas salariais atrasadas e dívidas herdadas da gestão anterior foram citadas como um dos pontos dificultadores para a administração do clube. O rival Cruzeiro foi parâmetro por duas vezes ao mencionar gastos excessivos e dívidas. “Nós recebemos o Atlético em uma situação muito pior que o nosso adversário lá estava do ponto de vista financeiro” – enfatizou o presidente. Na sequência, disse que o Atlético não vai “cruzeirar”, associando loucuras financeiras e o crescimento de dívidas para a montagem de elencos caros.

Apesar das críticas, protestos e pressão vividos nos últimos anos, e que podem aumentar no reencontro com a torcida, Sérgio disse que fica até o final do mandato e que não adianta pedir renúncia. O presidente elogiou a força do grupo, que ele considera o melhor dos três anos de gestão e destacou que todas as contratações da atual temporada foram aplaudidas pela torcida. Sette Câmara citou também a conversa que teve com o elenco antes do encontro com a imprensa. Ouviu o pedido dos jogadores para que haja trabalhos mais longevos e exigiu outra postura do grupo para que esse tempo maior aconteça com o futuro treinador.

Questionado pela imprensa sobre uma possível volta de Cuca, ídolo da torcida, Sette preferiu não comentar especulações, mas citou o nome de Carille, presente em manchetes nos últimos meses, mas que, segundo o presidente, nunca foi procurado por não ter o perfil desejado pelo clube.

Dias após elogiar o trabalho de Dudamel e reforçar o prestígio do técnico no clube, Sérgio disse que, além dos resultados insatisfatórios, tomou a decisão de demitir o venezuelano após conversar com pessoas que estavam no dia a dia da Cidade do Galo. Além da metodologia de trabalho, pesou, segundo o presidente, a forma como aconteciam as cobranças de postura dos atletas, preparação física, equívocos cometidos, entre outros fatores. Situações que não se encaixavam com a filosofia do futebol brasileiro.

Ao avaliar o desempenho de Rui Costa como o homem de confiança no futebol, Sérgio agradeceu pelo período em que o profissional esteve no clube e confessou ter participado diretamente nas contratações e montagem do time. Situação parecida com a saída de Alexandre Gallo, quando Sette listou nomes de atletas que o próprio presidente tomou frente das negociações.

A autocrítica ainda é a maior dificuldade nas entrevistas de Sérgio Sette Câmara. O elenco é bom, o diretor foi um grande parceiro, o treinador veio após longo planejamento e dívidas herdadas estão sendo pagas. Em trinta e cinco minutos de conversa com a imprensa, poucos segundos de erros do trabalho assumidos. O torcedor que assiste a entrevista tem a impressão de que se trata de um clube campeão brasileiro, continental e muito acima dos outros do país. Na vida real, Sérgio não enxerga o Galo que empilha fracassos nos últimos anos e é rejeitado por diversos profissionais que tem a instituição como a referência de onde não trabalhar. Existe um Atlético até a porta da Cidade do Galo e a catraca dá início a um mundo de ilusões em que os responsáveis pela proximidade com o fundo do poço se sentem perseguidos por parte da arquibancada e imprensa.

O torcedor preocupado com o futuro do Atlético não aumentou o percentual de esperança após as declarações do presidente, nem se sentiu motivado para dar mais um voto de confiança. Pelo contrário, deixa as barbas de molho para o restante da temporada, temeroso de quis serão as próximas decisões tomadas por quem errou praticamente tudo nos vinte e seis meses de gestão. O preço do ingresso continuará baixo e com rendas irrisórias, o sócio torcedor será lançado no meio da guerra. Efeito dominó!

Usar o Cruzeiro para alívio cômico arrancava risadas quando praticado pelo caricato Alexandre Kalil. No cenário atual, é preocupante que usem como referência um caso atípico na história do futebol brasileiro. “Não vamos chegar a esse ponto”. Como se o cheiro de falência alheio fosse causado apenas por contratar ‘x’ jogadores. “O lado de lá”, como ele mesmo disse, vive uma grande batalha de bastidores com a eleição que se aproxima. E o lado de cá?

Sérgio passa a impressão de que quer menos pressão, se incomoda com críticas e o andar da carruagem nas redes sociais parece incomodá-lo mais que a situação da instituição que ele preside. Após a coletiva, sinto que devo escrever uma carta pedindo perdão, como torcedor e jornalista. “Desculpa, Sérgio. Eu é que sonhei alto demais”.

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