
FOTO: DIVULGAÇÃO / SITE OFICIAL ATLÉTICO
Nunca vi o Senhor Djalma. Ele mora em São Tiago e é pai da minha amiga Maria Luíza. Foi a Maria que, quando o Senhor Djalma tinha oitenta e quatro anos, me disse que ele era atleticano. Uai, pensei: eu conheço o Senhor Djalma.
Como conheço todos os atleticanos. Senhor Djalma é igualzinho ao meu sobrinho e afilhado Iury, de cinco anos. Tem as mesmas reações do meu tio Ciro, de cinquenta e muitos ou minha irmã Elisângela, de quarenta e alguns. Aliás, Elisângela age igualzinho aos seus filhos, Mateus e Davi, ao meus filhos Natan, Naiá e Clara, ao meu amigo Pedrão de Ubá e a todos os outros dez milhões de seguidores desta que é a religião que mais cresce no mundo.
Pois é. O Galo não é desses clubes que mexem com esporte. Tem o Corinthians, o Flamengo e outros que trabalham com futebol. Outros como o Minas Tênis, o Cruzeiro, que militam nesse negócio de Vôlei, Corrida, essas coisas. Já o Galo lida com emoção, com sangue pulsando nas veias, com crenças no impossível.
Pergunte ao Iury de onze anos quem é o maior ladrão da História da humanidade e ele responderá que é o José Roberto Wrigth. E o assalto aconteceu em 1981! Eu sei que Zé do Monte se recusou a jogar pela seleção porque a única camisa que aceitava era a do Galo. Meu filho de dezenove anos sabe que o Brasil parou de jogar com clubes porque a seleção de 70, com Pelé e tudo, tomou uma “tarracada” no MIneirão antes da Copa de 70. Não é preciso ter vivido pra saber. O Galo nos faz atemporais, tão eternos quanto esta paixão que nos move.
Pouco tempo depois que a Maria Luíza me contou sua história, o Senhor foi chamado a torcer nos estádios onde hoje jogam Zé do Monte, Edvaldo (o Pepe Legal) e Cafunga. E quem narra os jogos é o mais completo do Brasil. Willy Goooonnnzeerrr.
Ah, Senhor Djalma. Essa paixão pelo Galo quase nos mata do coração. Aposto que o senhor chorou, como eu que tinha cinco anos na época, quando Cerezo perdeu aquele pênalti em 77. Em 80, quando o Aragão expulsou o Reinaldo depois do gol e o Silvestre deixou o Nunes chutar sem ângulo, tenho certeza que o mundo do senhor acabou. Não duvido que em 85, quando o Coritiba segurou o Galo na marra e no apito, o senhor jurou que Deus não existia. Sou até capaz de dizer que depois que o Euller fez um a dois naquele jogo contra a Portuguesa naquela semifinal fatídica, o senhor, como eu, assistiu o resto do jogo de joelhos, sem olhar pra televisão. E quando o galo caiu pra segunda, em 2005, Senhor Djalma, eu estava chorando ao lado do meu amigo Mário, que tem a mesma idade do senhor.
Esse Galo já nos pregou peças danadas… Mas a paixão só aumentou. Isso é o que nos diferencia. Fomos forjados no sofrimento mais intenso e por isso o nosso amor é o maior do mundo.
Mas, de 2013 pra cá, parece que chegou nossa vez. E temos a obrigação, nós que estamos vivos (o senhor sempre na minha memória, tanto que agora, me veio assim visitar a mente, sem avisar) pra presenciar este momento, de comemorar pelos atleticanos que se foram, pelos que nascerão. Nosso pão passou a cair com a manteiga pra cima. Temos um santo no gol, temos a bandeira de escanteio que já tabelou com o Guilherme bunda uma vez, temos o Luan a nos endoidecer. Temos essa massa que me dá arrepios só de pensar.
Maria Luiza me contou, Senhor Djalma, que o no dia da final do mineiro de 2015, o senhor fugiu do médico pra ver o Galo e recuperou a voz perdida pra gritar “É Campeão!”. Pois eu, no mesmo ano, no dia do Colo Colo, estava lançando um livro e saí mais cedo pra ver o Galo.
Nós nunca nos vimos, Senhor Djalma, mas, pode ter certeza. Eu abracei o senhor nos 4×1 contra Corinthians, choramos juntos no massacre contra o Flamengo, tínhamos a mesma certeza na final da Copa do Brasil.
Pode até parecer que nossa zica tenha voltado. Eu daqui e o Senhor aí de cima vemos o Fábio Santos correr e até pensamos que é o Ronildo. Mas, Senhor Djalma, já que está aí, dá um toque no Homem do Alto e avisa que já pagamos nossos pecados. Pode falar que antes do jogo contra o Cerro eu farei a tatuagem do milagre do Vítor no ombro (promessa de 2013) e que ele pode nos dar um 2019 de Galo.
O Galo não ganha campeonatos, o senhor sabe muito bem. O Galo faz História. Muito obrigado, Senhor Djalma, por comemorar, por sofrer, por entender comigo esse modo atleticano louco de levar a vida. Comigo e mais dez milhões de religiosos. Um número que não para de crescer.
E, principalmente, obrigado por ter aparecido, anos depois, assim sem avisar, nessa noite de quarta, para reavivar minhas memórias. Dormirei feliz.
Autor: José Geraldo de Araújo