
FOTO: VINNICIUS SILVA / FLICR OFICIAL / CRUZEIRO E.C.
Nesta segunda-feira (30) o Cruzeiro entra em mais uma etapa de mudança que poderá apresentar algum respaldo na vida política e na continuidade do clube em busca de uma reconstrução. O clube vota, hoje, através do seu questionado conselho deliberativo, qual será a nova mesa diretora do Conselho Deliberativo (presidente, vice-presidente, primeiro e segundo secretário) e o Conselho Fiscal (composto por seis nomes).
Se nos últimos anos (ou décadas) o Conselho Deliberativo do Cruzeiro sempre esteve nas sombras, hoje é alvo de críticas e a cada dia mais ganha holofotes. O motivo, é claro, passa pela atual fase: o conselho é responsável direto por grande parte das mazelas que o clube vive em diversas áreas. Se a equipe em campo, ainda em 2019, foi a responsável por rebaixar o Cruzeiro para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro, é o conselho o responsável por rebaixar moralmente o clube e levá-lo às páginas policiais.
Longe de ser um conselho ativo, com poder crítico ou qualquer possibilidade de se portar majoritariamente como oposição, o que se pode observar ao longo da história são decisões tomadas sem qualquer tipo de transparência. Subserviência ao poder executivo, sempre em troca de favores, interesses pessoais e profissionais, quando não vendido por regalias baratas como caldos, churrascos, medalhas e camisas.
É claro que não são todos assim, mas é preciso generalizar nesses momentos. A destruição do Cruzeiro não aconteceu apenas em 2019. Ela vem de décadas e mais décadas passadas. A construção de um conselho omisso, sem voz e com valores questionáveis, é parte de um projeto de poder maior do executivo, que sempre buscou a perpetuação. Quantas vezes você já ouviu a palavra “dinastia” atrelada diretamente ao Cruzeiro?
Conselheiros que trabalharam de forma remunerada para o clube, ferindo o próprio estatuto, conselheiros que recebiam mimos e agrados para compactuar com qualquer decisão, conselheiros que usaram a estrutura e o poder do clube para crimes de corrupção – não se esqueçam, o Cruzeiro teve conselheiro preso pela Polícia Federal, envolvido em esquemas de desvio de dinheiro do clube – e outros tantos perfis que só demonstram o quanto o clube foi forte por ter sobrevivido até hoje.
E não se trata apenas de um nome, ou uma organização. Sim, a tal “família união” tem sua grande parcela de culpa. Mas ela só existe, porque antes foi criado um caminho para que ela surgisse. E essa é a realidade do grande problema do Cruzeiro: o conselho só se forma por quem o sistema quer. Podem mudar os nomes, mas as regras do jogo determinam que apenas um perfil prevaleça.
Gosto sempre de citar um emblemático episódio de 2017 para contextualizar: expulsaram do conselho Antônio Assunção (conhecido como Toninho) que trabalhou de forma não-remunerada nas categorias de base e fez uma das maiores revoluções na modalidade, que culminou em jogadores revelados e títulos para a categoria – e também para o profissional! Esse mesmo profissional, que sequer conheço pessoalmente, mas admiro pelo trabalho feito, foi simplesmente expulso do conselho. Expulso com a mesma facilidade em que se arranja desculpas para não expulsar os 30 conselheiros remunerados pelo Clube no biênio 2018/19, que recebiam valores exorbitantes para realizar trabalhos questionáveis ou nem realizar trabalho algum. Afinal, alguém sabe até hoje o que Gustavo Perrella fazia no Cruzeiro, de fato e na prática, para receber R$190 mil?
Enfim, hoje o Conselho Deliberativo ganha novamente destaque: terá que escolher entre a chapa de Nagib Simões, conselheiro da “situação”, apoiado por Paulo César Pedrosa – juntos, nomes fortes da gestão de Wagner Pires de Sá, responsáveis por atestar “não existir problemas” nas contas do Cruzeiro durante a gestão do ex-mandatário – o que se provou mentira, logo depois – ou pela chapa de Giovanni Baroni, que se tornou uma voz de oposição diante de um vácuo que persistiu por anos nesse modelo.
Talvez o Conselho escolha a mudança, ainda que pequena, para dar alguma satisfação popular e cessar os protestos da torcida. Mas não seria surpresa se escolhessem pela manutenção do que, há décadas, vem dando muito certo. Muito certo para o sistema, óbvio. Nada certo para o Cruzeiro.