O Cruzeiro treina pouco? Conversamos com um especialista sobre o assunto

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FOTO: GUSTAVO ALEIXO / FLICKR / CRUZEIRO

Nesta semana, uma controvérsia veio à tona no mundo do futebol, mais especificamente na Toca da Raposa II, envolvendo o técnico Pepa e a intensidade dos treinos realizados. A polêmica girou em torno de declarações que apontavam para a falta de treinos em dois períodos como um dos motivos para o atual baixo aproveitamento do time no Campeonato Brasileiro.

Atualmente, os jogadores vem trabalhando em apenas um período do dia, o que levantou questionamentos sobre a eficácia desse método. Em busca de esclarecimentos, nossa reportagem conversou com o renomado fisiologista Eduardo Pimenta, Professor Doutor pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e ex-colaborador do Cruzeiro e da Seleção Brasileira.

Eduardo Pimenta explicou que o cenário atual do futebol brasileiro torna inviável a realização de treinos em dois períodos ao longo do dia. O desgaste muscular provocado pela intensidade das partidas e pelo calendário apertado aumenta significativamente o risco de lesões. “Já é cientificamente comprovado que adicionar mais carga e treino em um cenário de desgaste muscular aumenta em duas ou três vezes a probabilidade de lesão”, enfatizou.

Ele também fez uma comparação com a prática na Europa, onde os treinos de um único período são predominantes.

“Na Europa, não se treina em dois períodos, e isso não considera apenas a questão climática, mas também os deslocamentos frequentes e desgastantes. No Brasil, as condições geográficas e as viagens podem ser especialmente desafiadoras para os atletas”, pontuou o especialista.

Eduardo Pimenta, Fisiologista

Eduardo também destacou a evolução do futebol em termos de intensidade. Um estudo realizado ao longo de 12 anos na Premier League, o Campeonato Inglês, mostrou um aumento de quase 60% nas ações em alta velocidade durante as partidas. Essa mudança reflete uma nova abordagem no treinamento esportivo, onde a intensidade ganha maior importância em relação ao volume de treinamento. “A tomada de decisão do atleta precisa ser mais rápida, e ele deve ser mais ágil com a bola”, afirmou Pimenta.

Quando questionado sobre o problema do excesso de jogos, Pimenta ressaltou que os atletas enfrentam um grande desafio com o atual calendário do futebol brasileiro. A quantidade de partidas torna essencial o descanso entre os jogos.

“Uma semana com apenas um jogo é uma oportunidade para os jogadores se recuperarem. O próprio jogo é um mega treino e um treino específico. Hoje, na medicina preditiva, nós temos marcadores que conseguem antecipar o quadro muscular do atleta.”.

Eduardo Pimenta, Fisiologista

Como treinam os outros clubes?

Em apuração, nossa reportagem também levantou um dado interessante: nenhum dos 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro adota treinos em mais de um período durante a temporada. Isso reforça a tendência em direção a métodos que levam em consideração a intensidade e a recuperação dos jogadores.

Outro ponto que é passível de análise: em algumas poucas ocasiões durante esta temporada, a imprensa pode acompanhar o treinamento dos atletas. E ficou nítido, até para quem não é especialista, que há sim uma carga intensa nos treinos de Pepa sua comissão técnica, corroborada pelo discurso dos próprios jogadores ao longo dos jogos. Recentemente, o zagueiro Neris, que assumiu a condição de titular, falou ao canal oficial do clube sobre a preparação para os jogos:

“Nosso dia a dia de trabalho é entrega total de todos. Todos comprometidos. A gente está mantendo a intensidade nos treinos pra que os resultados aconteçam. A gente vem fazendo bons jogos, boa performance, mas por alguns detalhes que a gente precisa corrigir, pra que isso não aconteça e os resultados possam vir.”

Neris, zagueiro do Cruzeiro

Em conclusão, a “polêmica” sobre a quantidade dos treinos na Toca da Raposa II chama a atenção para a evolução do futebol e das forma como é feito esse treinamento. A ciência e a prática parecem convergir para a conclusão de que é necessário dar mais foco à intensidade do que ao volume, especialmente em um cenário de calendário congestionado e de grande desgaste muscular.

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