
FOTO: THOMÁS SANTOS/STAFF IMAGES
Pra começo de conversa, ter que se explicar é um negócio muito complicado. Geralmente, explicações implicam culpa ou arrependimento. Ou a simples necessidade de se justificar para se sentir bem consigo mesmo. Ou mais leve. Pois bem. Aqui não há justificativa, arrependimento e muito menos culpa.
O Cruzeirense não precisa de nada disto. O Cruzeirense viu o inferno bem de perto. Sentiu o terror que anunciava o fim do clube lhe queimar a alma e lhe roubar as noites de sono. O Cruzeirense sofreu uma dor incrível, que chegou a ser física. Mas, se esqueceram. O Cruzeirense é acostumado a guerrear.
Tanta festa, tanta emoção e tantas lágrimas com o retorno do time à elite do futebol brasileiro talvez pareçam exageradas para uma das torcidas mais acostumadas a ganhar títulos no país. Besteira das grandes! E esta história não é difícil de ser entendida.
O pesadelo dos Cruzeirenses em 2020 não tem precedentes. O gigante despedaçado, vivendo uma inimaginável situação, com a real possibilidade de fechar suas portas, não teve o apoio da torcida no pior momento de sua história, por causa da pandemia que parou o planeta. Sem poder acompanhar o time de perto e vendo o que já era terrível ficar ainda pior, a sensação de impotência dos Cruzeirenses foi se tornando cada vez mais insuportável.
Não havia luz no fim do túnel. O futuro conseguia a proeza de se desenhar ainda mais doloroso que o presente. Mas, ainda assim, o amor do Cruzeirense permanecia inabalável. Na verdade, se tornava ainda mais forte. Agarrados a uma esperança baseada muito mais na fé do que na realidade, os Cruzeirenses teimavam em não desistir.
Não foram poucas as vezes que disseram que o Cruzeiro ia morrer. Que disseram que o Cruzeiro ia acabar. E, vejam só, foi a partir daí que o jovem MC das Quebradas criou o mantra que fez com que Salomé e Pablito, Cruzeirenses históricos que se foram depois do rebaixamento, voltassem para os braços do seu povo, nas arquibancadas do Mineirão.
Três anos na Série B são um absurdo para um Fenômeno como o Cruzeiro. Os Cruzeirenses são os que mais sabem disto no universo. E vem daí o renascimento da esperança quando o clube foi salvo do que parecia não ter fim.
O que os Cruzeirenses estão fazendo no Mineirão nos últimos meses não é diferente do que fizeram durante toda a centenária história do clube. Sempre foi assim. O Cruzeiro foi criado e mantido pelo seu povo. O que chama a atenção dos incautos neste momento é o tamanho deste amor. Deste impressionante e infinito amor. Realmente, não é todo dia que se vê algo assim.
O grito que estava preso na garganta de cada Cruzeirense nestes últimos três anos se materializou e ganhou vida própria. Pareceu impossível por algum tempo. E deve ter sido mesmo.
Os reencontros de cada um. As ausências. As saudades. As lembranças dos que já foram e que estão cada vez mais presentes, em todas as vitórias. É lindo chorar por causa da volta. É maravilhoso! Só você sabe da sua dor e do que você passou. Só você sabe do que transborda do seu coração.
Peço desculpas aos Cruzeirenses que leram este texto até aqui. Vocês já sabiam de tudo isto, de cor e salteado. Dizem que ser Cruzeiro é bom demais. Aos demais amigos, espero que tenham imaginado, ainda que por um breve momento, a experiência do que é nunca abandonar um grande amor. Não foi explicação, mas espero que tenha ficado claro.
Voltei.
Marco Antônio Astoni
Jornalista – @MarcoAstoni