FOTO: BRUNO HADDAD / FLICKR / CRUZEIRO
Um dos movimentos mais importantes para reerguer a associação do Cruzeiro segue sendo a Recuperação Judicial (RJ). O processo que permitirá ao clube reorganizar suas dívidas, pagar seus credores e também evitar a falência da instituição, tem sido alvo de muitas dúvidas e questionamentos por parte de torcedores e partes interessadas.
Para entender o processo e como tudo está sendo feito, nossa reportagem, junto ao Canal SV, do jornalista Samuel Venâncio, entrevistou os representantes da empresa Alvarez & Marsal, Fred Luz e Leonardo Coelho, além do atual presidente da associação, Sérgio Santos Rodrigues, para saber os detalhes.
O plano de RJ foi apresentado pelo clube no meio do ano de 2022 e logo que o processo se iniciou, foi também aprovado pela justiça do estado de Minas Gerais. O caminho indicava uma resolução sem problemas e a assembleia geral dos credores, que seria mais um passo importante para a aprovação da RJ, estava marcada para o dia 7 de dezembro, mas foi suspensa por uma decisão da justiça, após o pedido de agravo feito pelo ex-atacante Fred.
Confira abaixo os principais trechos da entrevista e o vídeo na íntegra no final.
A importância da Recuperação Judicial e a garantia de recebimento por parte dos credores
“Do lado da Alvarez & Marsal, nós vamos diligentemente trabalhando para que os interesses estejam sendo respeitados. A RJ tem um ponto importante para renegociações de dívidas. O Cruzeiro fingia que fazia o acordo e não pagava. Na RJ isso não pode acontecer, o que for acordado terá que ser cumprido. E tem sérias penalidades se não for. Por isso é que esse entendimento pode demandar mais tempo e discussão, mas tem a vantagem pro credor: ele vai receber.”
Fred Luz – Alvarez & Marsal
“Não é o Cruzeiro que vai dizer se está certo ou errado. É o administrador judicial. É um ente que não é nem pró-devedor e nem pró-credor. É um fiscal para garantir que a dívida seja colocada dentro da RJ no seu valor correto.”
Leonardo Coelho – Alvarez & Marsal
Recentemente, o ex-treinador do Cruzeiro, Mano Menezes, veio a público reclamar sobre um possível deságio de 75% na dívida que o clube tem com ele. Como isso é na prática e porque isso ocorre?
“O processo de RJ dá uma hierarquia de como você trata a dívida de cada um. E essa hierarquia tá respeitada no processo do Cruzeiro. Credores maiores e mais ágeis, gostam de apostar contra o processo, porque no modelo atual, que existia até hoje, da renegociação de dívida, quem conseguia causar mais constrangimento pra associação, em geral, recebia primeiro. Esse constrangimento poderia ser a alienação de um imóvel, um fluxo de recebimentos, ou mesmo via imprensa, causando danos à imagem da associação. Dentro da RJ eles inexistem.”
“É um movimento natural, esses credores maiores, representados por advogados grandes e conhecem o processo tentam agir antes pra chegar a um acordo mais rápido com a associação, ainda que esse acordo seja do tipo ‘fingimento’. A RJ elimina esse tipo de assimetria na hora de discussão de dívida.”
Leonardo Coelho – Alvarez & Marsal
“O processo da RJ no que diz respeito à dívidas trabalhistas privilegia o recebimento em primeiro lugar dos menores valores.”
Fred Luz – Alvarez & Marsal
Quantos credores da categoria trabalhista, na prática, o Cruzeiro irá pagar de forma total o que deve e como é feito esse cálculo para que alguns tenham descontos nesses valores a receber?
“Quando a gente fala dos credores trabalhistas, o plano do Cruzeiro é: você tem 464 credores listados como classe 1 (trabalhistas). Aqueles credores que tem dívida de até R$20 mil, recebem em até 6 meses da homologação do plano integralmente. Se a dívida é de R$110 mil, você vai receber R$20 em até 6 meses da homologação do plano e os outros R$90 mil vai receber integralmente, em 3 parcelas corrigidas, anualmente, em cada aniversário do primeiro pagamento. Sua dívida está quitada em 3 anos sem nenhum deságio.”
“Esse é um processo que favorece os credores menores. Até esse limite de 180 mil reais, você tem daqueles 464 credores, 421 credores. Que numa situação de renegociação direta não seriam privilegiados.”
Leonardo Coelho – Alvarez & Marsal
“Você tem 464, 256 vão receber em até 6 meses, sem desconto e os demais vão receber em três anos, em três parcelas anuais, corrigidas, sem desconto. E o zunzun está na turma que tem muito dinheiro a receber. E vão receber, porque a história é que eles não tinham perspectiva de receber.”
Fred Luz – Alvarez & Marsal
Em relação ao recente posicionamento do Ministério Público de Minas Gerais, com base no que levantaram alguns credores sobre uma possível fraude no quadro geral de credores, como isso é feito? E quais os próximos passos após a suspensão da assembleia?
“Eu acho que a justiça está sendo cuidadosa e isso é importante. Quando você monta o quadro geral de credores, isso é feito com base no documento oficial que o clube tem. Ninguém inventa números. Mas, muitas vezes, a contabilidade não está na mesma velocidade na realidade. Especialmente em empresas e associações isso é comum, porque você tem uma rotatividade grande de colaboradores e esse processo fica atabalhoado.”
“Vamos checar se existe a possibilidade de fazer essa assembleia no dia 15, que era o dia imaginado como a segunda chamada, se ela não fosse instalada dia 7. Se não acontecer, é buscar uma nova data pra essa assembleia no prazo mais rápido possível, porque é importante pra associação resolver a sua dívida rapidamente e partir já para os pagamentos e importante para os credores, que esse seja um processo rápido. Ou a gente faz agora dia 15, o que eu acho menos provável, ou assim que houver um posicionamento do administrador judicial com relação ao quadro geral de credores.”
Leonardo Coelho – Alvarez & Marsal
No pior cenário, em que o clube não tenha seu plano de Recuperação Judicial aprovado, o que acontece no plano de falência? E quais as perspectivas?
“Num processo falimentar, todo credor que estivesse acima de 150 salários mínimos pra receber na classe trabalhista já estaria em risco. Aqui, não só não está em risco, como está recebendo. Acima de 180 mil reais com deságio de 75%, mas está recebendo. Numa situação de falência, nem isso seria capaz de garantir.”
“O plano é sério, é correto e é tecnicamente bem feito. Ele representa a real capacidade de pagamento do clube. Qualquer coisa acima disso, é utopia. E como é que vamos abraçar essa utopia, se lá na frente, o processo me levar a uma falência e atrapalhar o processo de todo mundo? Esse desenho de fazer plano pra resolver problema dos credores, a gente não faz. A gente faz plano pra maximizar a capacidade de pagamento do devedor e toda essa capacidade ser disponibilizada para os credores.”
Leonardo Coelho – Alvarez & Marsal