
FOTO: STAFF IMAGES / FLICKR / CRUZEIRO
Nunca te abandonei
Esse é aquele tipo de crônica que, depois de algum tempo, fica difícil de fazer. Já são seis anos acompanhando o dia a dia do Cruzeiro, mas na condição de jornalista. Para trabalhar em um ambiente tão ligado ao emocional, é preciso ser bastante racional. Aos poucos, me desapeguei do lado torcedor para não ter meu senso crítico e meu julgamento afetados pelo coração no momento da notícia.
É claro que amor não se vai. Amores, verdadeiros, não são passageiros. A felicidade com cada gol marcado está ali. Em alguns momentos, devidamente represada por “ossos do ofício”, mas eu garanto que ela existe. Mas eu decidi fazer do futebol minha profissão, minha fonte de sustento. Para isso, era preciso saber me comportar profissionalmente, independentemente do ambiente em que eu estava.
Nunca vou te abandonar
Ao final do ano de 2017 recebi um chamado: “estão roubando o Cruzeiro. Não posso deixar isso passar batido. Estou criando um site e quero que você trabalhe comigo lá”, disse meu atual chefe (e o irmão mais velho que eu nunca tive) Rodrigo Genta. Na hora, nem pensei no aquilo representava e respondi. “Tô dentro!”.
Mas é óbvio que eu não sabia o que me esperava. Quando percebi, estávamos remando uma jangada simples contra a maré de um oceano muito turbulento. Populistas tomaram conta do Cruzeiro, atrocidades eram cometidas, nós apontamos e gritamos tudo o que sabíamos, mas não éramos o suficiente pra fazer o barulho necessário. Pequenos, independentes, com uma má fama que não nos precedia. E pra piorar, os resultados ajudaram aqueles que estavam usando um gigante brasileiro para benefício próprio. A nós, sobraram os apelidos e o deboche.
Onde você for, eu vou estar
Em alguns momentos até incomodamos gente grande. De verdade. Mas em outros, com tanto descrédito, me contestei se aquilo ali valia todo o trabalho e o sacrifício. Foram alguns anos com receio de pisar no estádio – a proximidade daqueles que denunciávamos com algumas torcidas era nítida – e o trabalho foi sendo dificultado. Vieram ameaças, números de telefone vazados, uma política institucional de queimar reputações. Os ataques vieram até de gente com a qual eu já tive alguma consideração. “São inimigos”, diziam.
Vieram até processos e gastos financeiros que só desanimavam. Não, não estava valendo a pena. Mesmo com o site crescendo com o passar do tempo. Os números de acessos e compartilhamento eram bons, antes mesmo de tudo vir à tona. As vezes em que desistir parecia ser o único caminho não foram poucas. Mas dizem que é na trincheira que conhecemos quem pode, de fato, andar ao nosso lado.
Mas se esqueceram, eu sou acostumado a guerrear
Um dos problemas do ser humano é o tal do orgulho. Ele pode ajudar e atrapalhar. Quando tudo explodiu e o Cruzeiro despencou do abismo, a vontade era chamar cada um e dizer: “eu avisei, você merece!”. Mas não havia tempo para isso, a queda até o fundo do poço é um caminho grande. A gente precisava continuar trabalhando. Aqueles que acabaram com o clube não podiam (e nem podem) ser esquecidos. E sem tempo para as lágrimas, ok?! Disse no começo do texto que o foco é o trabalho. E, além disso, era preciso ver um gigante ressurgir.
Mas é óbvio que um tombo tão feio ia deixar fraturas. Fraturas bastante expostas. E ali estávamos nós, de novo, remando a nossa pequena jangada. E, de novo, tentaram enganar. Falaram que seria fácil, quando sabíamos que não. O filme parecia se repetir. Estávamos ali, de novo, apontando cada erro, cada atitude escabrosa, cada desmando. O Cruzeiro não iria sobreviver só com cuidados paliativos. Era necessário uma cirurgia de risco. Do contrário, a cada dia uma nova sequela poderia aparecer.
Hoje, é o dia da glória
É impossível transmitir tudo o que eu senti nestes últimos anos em palavras. E sei que se o texto ficar muito extenso, ninguém vai ler (obrigado, SEO). Mas, se você chegou até aqui, eu agradeço. Quando ficamos sabendo tudo o que estava sendo feito para que o Cruzeiro fosse vendido ao Ronaldo, e quais as principais consequência disso, voltei a sentir uma felicidade genuína. O Cruzeiro sairia da mão de pessoas que não eram só incompetentes, mas usurpadores, aproveitadores, omissos e tantos outros adjetivos pejorativos que nem cabem aqui.
E ver aqueles que nos julgaram tão mal, admitindo nosso papel neste momento, foi reconfortante. Receber mensagens de torcedores, colegas jornalistas, influenciadores e tantos outros, que nos elogiam pelo nosso trabalho – que ainda é pequeno, não deixou ninguém rico e está longe de ser unanimidade – é a certeza que lá em 2017 eu escolhi, sim, o caminho certo.
De fazer história
Obrigado, Ronaldo! Foi também graças a você que eu pude voltar ao estádio, sem medo. Como torcedor, no meus dias de folga, podendo levando meu filho mais velho pela primeira vez ao campo. E também como profissional, jornalista, diplomado, devidamente registrado e credenciado, para cobrir com isenção o dia a dia do Cruzeiro. Ah, e fica o aviso: nossa linha editorial se mantém. Se for preciso cobrar, criticar e apontar erros, o faremos.
Mas, por enquanto, pode comemorar.
Voltamos.